Em primeiro lugar gostaria de esclarecer a nomenclatura. É muito comum utilizarmos o termo “complemento” para nos referirmos ao uso de fórmula infantil além da mamada ao seio materno ou quando oferecemos leite materno ordenhado. Segundo a classificação de tipos de aleitamento materno da Organização Mundial da Saúde (OMS), a nomenclatura seria Aleitamento materno misto ou parcial para o primeiro caso e Aleitamento materno exclusivo para o segundo.
De qualquer forma, neste texto, vou tratar sobre o termo “complemento” como sendo o uso de fórmula infantil ou leite materno ordenhado. Irei abordar ainda quando indicar o uso e quais as técnicas para administração do complemento.
Quando é necessário complementar o leite materno?
O primeiro ponto sempre é avaliar a possibilidade de ordenhar leite materno para ser oferecido ao bebê. Quando ele estiver disponível, priorizar a sua administração em relação à fórmula. Não sendo possível, a complementação da amamentação com fórmula infantil pode ser indicada nas seguintes situações:
- Bebês com hipoglicemia que não melhoraram após o seio materno e uso de gel de dextrose.
- Bebês muito prematuros cujas mães não conseguem ordenhar leite materno suficiente.
- Lactentes mal nutridos ou desidratados, para quem o leite materno isoladamente não é suficiente para restabelecer as deficiências.
- Bebês com doenças como fenilcetonúria, leucinose e outras que precisam do uso de fórmulas especiais.
- Bebês internados em UTI cujas mães não conseguem ordenhar leite suficiente.
- Mães doentes temporariamente e que não podem amamentar diretamente o bebe ao seio materno.
- Bebês com dificuldade de extração de leite diretamente da mama como em alguns casos de anquiloglossia, disfunção oral, muito baixo peso, muito prematuros, bebês sindrômicos, fenda palatina etc. Lembrar que mesmo nessas situações é possível a mamada diretamente ao seio materno e que apenas alguns bebês não conseguem.
- Baixa produção de leite primária ou secundária.
- Mãe com muita dor a amamentação que impossibilita a mamada diretamente ao seio.
- Bebês com baixo ganho de peso. Muito cuidado!!! Nesse caso é preciso descobrir a causa e não apenas complementar.
A decisão de complementar a amamentação deve ser tomada com a ajuda de um profissional de saúde que pode avaliar a situação e recomendar a melhor opção para o bebê. Em muitos casos, a complementação com fórmula ou leite materno ordenhado pode ser temporária e o bebê pode voltar a se alimentar exclusivamente ao seio materno após um tempo.
É importante lembrar que a amamentação é um processo complexo e a complementação deve ser usada como uma solução temporária e sob orientação médica. A mãe deve ser encorajada a continuar amamentando e a buscar ajuda profissional para resolver qualquer problema que possa estar afetando a amamentação.
Ainda, gostaria de colocar uma situação que muitas mães perguntam: “Posso dar seio materno durante o dia e fórmula à noite para descansar?” ou “Posso intercalar leite materno com fórmula?”. Sempre pondero que nestas situações a mama ficará muito tempo sem ser estimulada e haverá também uma diminuição da demanda de leite materno levando a grande risco de baixa produção de leite. Nesses casos sempre conversar bastante com os pais, acolher, informar riscos, ajudar a pensar no porque a amamentação está “pesada” demais, dar alternativas e aceitar a decisão materna.
Como complementar a amamentação?
Para administrar o leite materno ordenhado ou fórmula infantil ao bebê devemos evitar o uso de mamadeira que pode levar a “confusão de bico” e ao desmame. Existem várias maneiras de oferecer leite ao bebê sem precisar usar uma mamadeira. Aqui estão algumas opções de técnicas de complementação:
Relactação ou translactação:
Consiste em colocar o leite em um recipiente abaixo das mamas e o uso de uma sonda nasogástrica nº 4, de preferência ao invés da nº 6, ou um relactador. A ponta da sonda com “furinhos” fica junto ao mamilo, podendo fixar com micropore na pele, e a outra extremidade dentro do recipiente. Ao realizar a pega o bebê deve abocanhar a aréola e a sonda junto. Dessa forma, conforme o bebe suga ele extrai o leite do recipiente através da sonda e ao mesmo tempo estará estimulando a mama.
Técnica do Copinho
É uma boa alternativa para alimentar o bebê quando o seio materno não for possível.
Segue um passo a passo da técnica:
- Utilizar copo com a boca larga
- colocar leite pela metade.
- Colocar o bebe semi sentado no colo do cuidador e apoiar a nuca e costas com a mão mantendo a cabeça alinhada com o tórax e não curvar as costas.
- Posicionar a borda do copo entre o lábio inferior do bebe e a língua, de forma que a língua possa se projetar para dentro do copo e as bordas se apoiem no canto da boca.
- deixar o leite tocar o lábio do bebe.
- Inclinar o copo quando o bebe pedir leite de forma que o bebe tome o leite com lambidas ou como um “gatinho”.
- Atenção: dê pausas quando o bebe pedir e não despeje o leite para dentro da boca do bebe para ele não engasgar.
Assista o vídeo abaixo, da Sociedade Brasileira de Pediatria, para entender melhor essa técnica.
Colher
A colher é outra opção que pode ser usada para oferecer leite ao bebê. Escolha uma colher pequena e com bordas arredondadas para evitar ferir a boca do bebê.
Finger feeding
Técnica onde é fixada uma sonda nasogástrica ao dedo mínimo do profissional ou cuidador e a outra extremidade no recipiente com leite ou seringa. A sua utilização para alimentação do bebê é controversa sendo mais utilizada durante a realização de exercícios orais, por exemplo na disfunção oral, para estimular a sucção do bebê.
Sonda orogástrica ou nasogástrica
Utilizada nos casos de bebês que não podem se alimentar pela boca como prematuros extremos, bebês muito doentes internados em UTI. É inserida uma sonda pela narina ou pela boca do bebê que chega ao estômago e o leite é administrado através desta sonda.
Independentemente do método escolhido, é importante lembrar que o objetivo principal é garantir que o bebê esteja recebendo os nutrientes necessários para crescer e se desenvolver adequadamente.
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Criado por:
Tiemi Marli Yoshida
Pediatra, Neonatologista, Especialista em Aleitamento Materno/IBCLC
Sócia da Casa Curumim e Fundadora do Instituto Ery